top of page

SEARCH RESULTS

55 itens encontrados para ""

  • J. Altair

    João Altair de Barros (1934-2013) se tornou J. Altair no universo das artes visuais a partir da década de 1950, quando estudou com o pintor italiano Vicente Perllasca. Altair é, talvez, o único pintor babalorixá no Brasil. Filho de Bará, da nação Yjexá (Ijexá é uma nação africana formada pelos escravizados vindos de ilesa na Nigéria, concentrada nas religiões Batuque e Candomblé, tendo sua base em orunmila-ifá, e seus métodos adivinhatórios dos odú), o artista fez da arte uma profissão de fé. Suas obras remetem a universos de símbolos e cores que plasmam as mitologias da religião dos Iorubás. Sua produção, onde predomina a técnica de acrílico sobre tela, é caracterizada pela intensidade de cores, uma forma de luz que corre por veias ancestrais, por onde se encontram os orixás, suas danças e práticas ritualísticas, ressignificando a herança e o patrimônio negro. J. Altair foi um artista que deixou marcas para além do Rio Grande do Sul. Nas décadas de 1950, 1960 e 1970 militou em vários movimentos de artes plásticas, ocasiões em que realizou diversas exposições em São Paulo. Em Porto Alegre, fez várias exposições individuais e participou de mostras coletivas importantes como o I Salão de Artes Plásticas em 1970, da Galeria Orca-Morganti, em 1971 e da Galeria Ítalo-Belga, em 1972. Na década de 1990, suas obras encontram espaço no Copacabana Palace Hotel e na Galeria Jean Jacques Urca, no Rio de Janeiro. Também possui obras no acervo de diversas instituições, como a Galeria Salomé em New Orleans (EUA), Museu Internacional de Arte Naif (RJ) e coleções privadas entre as quais se destaca a do artista uruguaio Carlos Paez Vilaró. Está presente em Porto Alegre nos acervos do Margs e da Pinacoteca Aldo Locatelli, da Prefeitura de Porto Alegre. Era original e inovador sendo considerado até hoje um mestre na arte naif no Rio Grande do Sul. Suas últimas mostras individuais foram em novembro de 2012 no Espaço IAB e na Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Antes de encaminhar a carreira de artista, o mestre era letrista por profissão e ativo nos espaços de sociabilidade negra, sendo um dos fundadores, junto, entre outros, com o músico Giba-Giba da Escola de Samba Praiana. Ainda, segundo Daniela Espíndola, foi um dos fundadores, por um breve tempo, em companhia do Nego Lua, do imagético bar Luanda, na Rua José do Patrocínio, 988. J. Altair faleceu na sexta-feira, dia 15 de fevereiro de 2013. Referências: https://www.blackbrazilart.com.br/ingenuo-e-primitivo Disponível em: 09/06/2023 http://jaltairnaif.blogspot.com/p/o-artista.html Disponível em: 31/05/2023 ESPÍNDOLA, Daniela Rodrigues. Nego Lua: o legado de um importante e influente militante negro de Porto Alegre. Concurso Décio Freitas/ Funproarte-SMC. Porto Alegre. 2015. SILVA, Luiz Mariano Figueira. A Formação do Acervo Artístico de Porto Alegre: A gênese das pinacotecas municipais nos anos 1970. Trabalho de Conclusão de Graduação em Museologia. Porto Alegre: UFRGS, 2013.

  • Isaura Dias Bittencourt

    Neta da africana Maria Conceição, Isaura da Conceição nasceu em 1878, em Porto Alegre. Foi batizada na Igreja Madre de Deus e recebeu somente o sobrenome devocional de sua mãe – Conceição. Com o casamento de seus pais no ano de 1892 (Thomaz da Silva Dias e Josepha Conceição), agregou o sobrenome paterno Da Silva Dias. Primogênita dessa união, teve mais seis irmãos, Ildefonso, Hilda, Thomaz, Clotilde, José e Octávio. Sua família era prosperou economicamente. Essa ascensão econômica dos membros da família Silva Dias deu-se provavelmente a partir dos bens repassados por Maria Conceição a seu filho Thomaz da Silva Dias, homem negro letrado e pequeno comerciante no arraial do Menino Deus, membro da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e do Clube Republicano ligado ao Partido Republicano Riograndense (PRR). Os filhos homens acessaram o ensino público e os cursos de engenharia e direito, o que já era raro para uma família negra naquela época. Para as mulheres da família Silva Dias, no entanto, não é possível precisar se receberam alguma instrução. Porém, como a educação era um dos principais objetivos para a comunidade negra de então, é possível que tenham frequentado aulas com professores particulares ou ainda no círculo familiar do marido. Isaura casou-se no ano de 1895, aos 17 anos, com o viúvo Aurélio Viríssimo de Bittencourt, este com 46 anos, tendo seu nome alterado para Isaura Dias de Bittencourt. Presume-se que ela tenha sido apresentada ao futuro esposo pelo pai ou pelos irmãos, visto que conviviam nos mesmos meios culturais, sociais e religiosos. Depois do matrimônio, nos anos posteriores, o jornal A Federação – órgão de imprensa do PRR – veiculou o nome da senhora dona Isaura Dias de Bittencourt ligando-o a várias irmandades religiosas da cidade de Porto Alegre. As irmandades, principalmente a de Nossa Senhora do Rosário, foram espaços importantes no amparo de seus membros durante o período do escravismo e posteriormente a este. Além das alforrias e da assistência médica, constituíram-se como locais de construção das redes de sociabilidade e, também, de ascensão e visibilidade social. Os espaços das irmandades eram frequentados por vários membros da sua família de origem, como Thomaz da Silva Dias e seu padrasto José Justino. Dentro de seus trajetos por estas associações religiosas, Isaura cumpriu diversas funções de destaque, como a de juíza por devoção a São Francisco Xavier, no ano de 1896. No jornal A Federação de 30 de janeiro de 1901, ela aparece nas festividades da Irmandade da Nossa Senhora do Rosário como aia, juntamente com sua mãe, Josepha Conceição. As aias tinham o compromisso de vestir a imagem do santo ou da santa antes do início das novenas, o que somente era dado a pessoas de destaque na sociedade. Em 1915, conforme o referido jornal, ela foi encarregada da novena, ocupando também posições importantes e de relevo dentro das irmandades brancas da cidade. Foi integrante da Irmandade de Nossa Senhora das Dores nos anos de 1916 e 1917 e zeladora nas festividades de Nossa Senhora da Conceição e de Nossa Senhora da Glória. Ainda em 1916, é também aia na Ordem Terceira da Igreja das Dores, irmandade majoritariamente composta pelos brancos da elite citadina. Nas décadas de 1920, registros de sua atuação nas irmandades tornaram-se mais raros, mas seu nome surge novamente no jornal A Federação, na coluna vida social, destacado dos demais com felicitações de aniversário. Outros registros também são evidenciados, como a saída para a cidade de Garibaldi, provavelmente para tratar das frequentes tosses e, também, as contínuas enfermidades (1923) as quais Isaura fora acometida. Isso, até o agravamento do sei quadro de doenças no mês de janeiro de 1925, resultando em seu falecimento em dezembro do mesmo ano, diagnosticada por tuberculose pulmonar. Apesar de sua trajetória e vivência no catolicismo, conforme seu obituário, as cerimônias fúnebres foram realizadas por meio da doutrina espírita solicitada por seu irmão Ildefonso da Silva Dias. Posteriormente, em 1946, um conjunto importante de objetos pessoais seus – sete leques, por exemplo – foram doados ao acervo do Museu Júlio de Castilhos. Sua atuação como mulher negra frente às irmandades católicas negras, pardas e brancas da cidad, evidenciou o seu protagonismo, articulação e visibilidade dentro da sociedade porto-alegrense do pós-abolição. Bibliografia: FERRUGEM, Isabel Cristina. Relatório de Estágio Supervisionado II: Museu Julio de Castilhos, 2013. Jornal A Federação. Jornal O Exemplo.

  • Ildefonso da Silva Dias

    Nasceu em maio de 1880, em Porto Alegre. É filho de Thomaz da Silva Dias e de Josepha Conceição Dias, e irmão de Isaura Dias de Bittencourt e do advogado José Dias. Ingressou no curso de engenharia no ano de 1900, sendo um dos primeiros profissionais negros formados pela Escola de Engenharia, posteriormente, vinculada a Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi um dos criadores do Grêmio dos Estudantes da Escola de Engenharia (1903), onde exerceu a vice-presidência. Fez parte do Clube Republicano e da Irmandade Nossa Senhora do Rosário e como os demais membros da família Silva Dias, Ildefonso Dias atuou profissionalmente na Viação Férrea do Rio Grande do Sul, sendo diretor substituto e chefe da Divisão de Estatística durante do governo de Borges de Medeiros dirigindo, assim, vários trabalhos de construção e ramais ferroviários. Sempre referido no jornal O Exemplo como trabalhador dedicado, escreveu durante três décadas publicando vários textos relativos ao espiritismo. Foi redator e publicou a Revista Reencarnação em 1934, e é um dos fundadores da Federação Espírita do Rio Grande do Sul (FERGS) sendo seu presidente em duas gestões. Em julho de 1976, Ildefonso Dias falece de morte natural sem deixar herdeiros. Bibliografia: FERRUGEM, Isabel Cristina. Relatório de Estágio Supervisionado II: Museu Julio de Castilhos, 2013. Jornal O Exemplo.

  • Horacina Correa

    Cantora e atriz. Nascida em Porto Alegre na década de 1910, sua trajetória está vinculada aos territórios negros da cidade e seus carnavais e, também, às rádios locais. Foi solista do bloco carnavalesco Turunas, originário da Colônia Africana. Nos anos de 1930, já cantava nas rádios Difusora, Gaúcha e Farroupilha. Em 1936, se casou com o músico Oscar Corrêa, sendo a cerimônia de casamento transmitida ao vivo pela Rádio Farroupilha. Era considerada uma das melhores intérpretes de Lupicínio Rodrigues, mas também gravou músicas de Ary Barroso e Noel Rosa. Como atriz, na década de 1940, atuou em alguns filmes dos estúdios Atlântida e Cinelândia ao lado de Oscarito, Nelson Gonçalves e Emilinha Borba. Logo após a projeção internacional, Horacina Corrêa se estabeleceu em definitivo no Egito. Com isso, informações sobre sua trajetória não mais foram obtidas. Referências: HORACINA Corrêa: uma saudade boa de se sentir. In: Beco do Rosário. [S. l.], 8 mar. 2019. Disponível em: https://becodorosario.wordpress.com/2019/03/08/horacina-correa-uma-saudade-boa-de-se-sentir. Acesso em: 23 abr. 2023.

  • Djalma do Alegrete

    Nascido com o nome de Djalma Cunha dos Santos, em Alegrete, no Rio Grande do Sul, se autonomeou Djalma do Alegrete para não ser confundido com o ex-jogador de futebol Djalma dos Santos. Ao longo de sua trajetória, conviveu com o prestígio e a marginalidade social, como ele mesmo reconheceu quando disse: “apesar do prestígio que consegui, sou marginal por ser homossexual e negro”, em notícia do O Globo, em 06 de novembro de 1988. Djalma do Alegrete foi multiartista: pintor, decorador, cenógrafo, educador, figurinista e carnavalesco. A partir de 1956 surge como pintor, participando de exposições coletivas e individuais, onde se destaca o IX Salão de Artes Plásticas da Sociedade Xico Lisboa (1958), a coletiva de artistas sul-rio-grandense no Leme Palace Hotel (1968), a mostra individual no Instituto Cultural Brasil – EUA (1962), a Galeria Pancetti (1967) e outras. Estudou artes plásticas e jornalismo, sendo apontado como o primeiro aluno negro do Instituto de Belas Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Para se qualificar como professor, frequentou o curso de didática na Faculdade de Filosofia em 1958. Transitando com desenvoltura nos espaços de sociabilidade negra, marcou presença nos carnavais de rua de Porto Alegre se tornando figurinista destacado, atividade pela qual recebeu diversos prêmios: foi pentacampeão (1959-1963) de vestimentas de blocos carnavalescos. No primeiro ano, venceu com a temática “Civilização Inca”, como consta no livro coordenado por Irene Santos, Negro em Preto e Branco: história fotográfica da população negra em Porto Alegre, onde está reproduzido um croqui elaborado para a “ala dos pajens do maracatu”. Recebeu notoriedade internacional por ter desenhado o traje “Exaltação dos Pampas” usado pela gaúcha Ieda Maria Vargas, vencedora do concurso Miss Universo em 1963, nos Estados Unidos. Como pintor, marcou sua carreira na década de 1960 por ter trabalhos premiados nos Estados Unidos e no Panamá. Passa a viver no Rio de janeiro como uma espécie de refúgio em razão do racismo explícito que vinha acompanhado de seu sucesso profissional, conforme relata o Correio da Manhã, em 23 de junho de 1963: “O figurinista gaúcho Djalma dos Santos, por causa da segregação racial que existe no Rio Grande do Sul (ele é de cor) deixará Porto Alegre em agosto”. Para confirmar a situação, Djalma relata sobre a discriminação sofrida, inclusive recebendo pedradas e humilhações, quando foi professor de artes em uma cidade do interior gaúcho. Em sua percepção, a própria temática que trabalhava no campo das artes: religiões e origens africanas, incluindo lendas negras do afro-brasileiro, não encontrava espaço no seu estado natal. Em vídeo do CULINE (Acervo Digital da Cultura Negra), aparece em uma de suas exposições confirmando que “a cultura afro-brasileira como tema não encontrava nicho no Sul, onde lhe dizem que podia comprometer os comparadores”. Djalma do Alegrete foi ainda educador social no Rio de janeiro, cidade que lhe concedeu o título de Cidadão Emérito, porém não desistiu de Porto Alegre, retornando a capital gaúcha em 1971, vindo a receber mais tarde, a honraria de Cidadão Emérito de Porto Alegre, em 1992. Faleceu em 22 de abril de 1994. Referências: https://www.ufrgs.br/jornal/djalma-do-alegrete-o-marginal-glorificado-do-rio-grande-do-sul/ Disponível em: 26/05/2023 https://www.ufrgs.br/helenadosul/2020/08/djalma-do-alegrete/ Disponível em: 26/052023 https://acervo.cultne.tv/cultura/artes-plasticas/309/artes/video/579/djalma-do-alegrete Disponível em: 09/06/2023 SANTOS, Irene. Negro em Preto e Branco: história fotográfica da população negra em Porto Alegre. Porto Alegre: EST Edições, 2005

  • Dario de Bittencourt

    Nascido a 7 de fevereiro de 1901, filho de Maria da Glória Quilião de Bittencourt e Aurélio Viríssimo de Bittencourt Júnior, foi criado pelo seu avô, Aurélio de Bittencourt, após a morte de seu pai, em 1910. Dario de Bittencourt expôs em sua autobiografia nunca mais ter se encontrado com a mãe. Em uma passagem no jornal O Exemplo, Dario foi lembrado como “o futuro menino Dario, filho do nosso amigo Dr. Aurélio Júnior” pelos redatores de O Exemplo. Ele estudou no Ginásio Nossa Senhora da Conceição e bacharelou-se em Direito, porém pela Faculdade Livre, fundada em Porto Alegre com o auxílio de seu pai. Ganhou algumas premiações no Ginásio Nossa Senhora da Conceição pelo belo desempenho. Passou a acessar o Ginásio Anchieta em Porto Alegre no final 1912, assim como o Ginásio Nossa Senhora da Conceição e, recebendo algumas distinções, concluiu o colegial. Dário se preparava desde 1915, realizando exames preparatórios, mas foi somente em 1920 que ele ingressou na Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre. Frequentou o curso de vestibular do Padre Werner, do Ginásio Anchieta, onde fez parte da primeira turma a efetuar a prova. Em 1924, conseguiu se tornar bacharel e, mais tarde, trabalhou como professor nessa mesma instituição. Um pouco antes, em 1918, acessou o curso preparatório do Irmão Weibert, localizado atrás da antiga Catedral Metropolitana. Por ter uma vida um pouco melhor em virtude da respeitabilidade conquistada pelo avô e tutor, obteve acesso a professores particulares de Matemática, Português, Inglês e História Universal. Dario era um homem pardo e destacou o orgulho racial em sua autobiografia, publicada em 1958. Levou uma vida modesta, mas sempre auxiliou para manter o jornal O Exemplo em funcionamento. Ele se manteve firme na tradição que foi criada pelo jornal, que era o combate ao preconceito de cor e a luta pelos direitos da população negra no pós-abolição. Caminhou para a advocacia militante, assim tendo mais recursos para essa luta. Dario circulava pelas organizações negras, fez parte da Sociedade Beneficente Floresta Aurora, fundada em 1872, participou do Conselho Superior da Liga Nacional de Futebol Porto-Alegrense, fundada em 1919, para agregar times compostos com jogadores negros, foi sócio da Sociedade Satélite Porto Alegrense, de 1902, que hoje é conhecida como Satélite Prontidão e, finalmente, fez parte do Grêmio Náutico Marcílio Dias. A sua autodefinição como pardo remetia à situação social e racial intermediária de uma elite negra que procurava ascender e inserir-se socialmente, não apenas em virtude da situação econômica e intelectual, mas sobretudo no sentido de se distinguir da maioria negra, ainda muito vinculada ao período anterior da escravidão. No espaço da religiosidade. Dario de Bittencourt fez parte da secular Irmandade do Divino Espírito Santo, frequentou colégio jesuíta onde teve instrução religiosa nas décadas de 1940 e 1950, fez parte da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, da Confraria de Nossa Senhora da Conceição e da Devoção de São Cristóvão, além de legionário das obras da Catedral Metropolitana e da matriz de São Sebastião. Mesmo convivendo em espaços religiosos eurocidental, também percorreu a sua raiz africana, assim se envolveu com as religiões de matriz africana. Inclusive, a convivência com uma senhora ex-escrava, Senhorinha de Souza, pode ter auxiliado nas opções de Dario tanto no campo intelectual quanto de identificação étnico-racial. Adepta a religião de matriz africana, ela indicou para Dario buscar outro viés de sua vida espiritual que o completasse. Com seu envolvimento com a religião de matriz africana, ele escreveu o artigo “A liberdade religiosa no Brasil: A Macumba e o Batuque em face da lei”, que enviou, em 1937, ao II Congresso Afro-Brasileiro, realizado em Salvador. O objetivo era apresentar o candomblé africano como religião, buscando uma maior aceitação social, desse modo, distanciando da ideia de feitiçaria. Após os anos 1930, Dario frequentou as casas de nação de Mãe Andreza, Andreza Ferreira da Silva e sua filha de sangue e espiritual, Caixinha, Geraldina Alves Ribeiro, de Dona Moça, de Joana do Bará. Mesmo percorrendo vários espaços e quase seguindo a carreira que vários membros do periódico seguiram, sendo funcionário público, ele se aposentou em 1957 como professor catedrático de Direito Internacional Privado da Faculdade de Direito da Universidade do Rio Grande do Sul. Em 1920, Dario passou a fazer parte da direção de O Exemplo, herdando a tradição de seu avô, pai e tio, assumindo um papel de liderança. Segundo ele, reconhecido socialmente como notória e sabidamente mulato, Dario se coloca nas fileiras de organização do jornal no combate ao preconceito de cor até 1930, quando o jornal encerra os seus trabalhos. Referências BITTENCOURT, Dario de. Curriculum vitae–documentário (1901/1957). Porto Alegre: Ética Impressora Ltda, 1958. PERUSSATTO, Melina Kleinert. Arautos da liberdade: educação, trabalho e cidadania no pós-abolição a partir do jornal O Exemplo de Porto Alegre (c. 1892-c. 1911). 2018. BARRERAS, Maria José Lanziotti. Dario de Bittencourt (1901-1974): uma incursão pela cultura política autoritária gaúcha. Porto Alegre: Edipucrs, 1998. v. 21.

  • Breno Higino Mello

    Breno Higino Mello foi jogador e ator, nascido em Porto Alegre em 7 de setembro de 1931. Veio a falecer na mesma cidade, no dia 11 de julho de 2008, deixando cinco filhos e 12 netos. A carreira futebolística de Breno Mello foi marcada pelas passagens pelo Fluminense do Rio de Janeiro e Corinthians (1957). Mello começou no São José, time da capital gaúcha. Logo em seguida transferiu-se para Grêmio Esportivo Renner, onde foi campeão em 1954 desbancando a dupla Gre-Nal, time tradicional do cenário do futebol gaúcho. Uma curiosidade: Breno morou no bairro Niterói, em Canoas, no mesmo período em que Paulo Roberto Falcão e Batista, ambos jogadores que, mais tarde, seriam grandes estrelas do Sport Club Internacional de Porto Alegre. Breno Mello foi ator, ainda quando defendia o Fluminense do Rio. Ele foi descoberto pelo diretor Marcel Camus e acabou atuando como protagonista, interpretando o personagem título do filme, Orfeu, baseado na peça homônima de Vinícius de Moraes. O filme foi rodado em 1959, contou com a trilha refinada de Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Luiz Bonfá e Antônio Maria. O Orfeu do Carnaval ganhou inúmeros prêmios, entre os quais a Palma de Ouro em Cannes, em 1959, o Globo de Ouro e o Oscar de filme estrangeiro em 1960. Breno Mello ainda jogaria por mais um tempo no Santos de Pelé. Reza uma lenda que Mello teria pago vários almoços para rei devido ao seu “pão durismo”, mas acabou decidindo continuar na carreira no cinema. Participou nas seguintes produções além de Orfeu: Os Vencidos (1963), Rata de Puerto, também de 1963, e O Santo Módico (1964). Em 1973, participa do filme Negrinho do Pastoreio (dirigido por Nico Fagundes) ao lado de Grande Othelo e, em 1988, participa da produção Prisioneiro do Rio. Uma curiosidade acerca do nome de Breno Mello e do ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Essa curiosidade foi especulada pelo escritor Fernando Jorge em seu livro Se não fosse o Brasil, jamais Barack Obama teria nascido. Segundo Fernando Jorge, a mãe do ex-presidente, a antropóloga Stanley Ann Dunham, quando assistiu ao filme Orfeu, teria ficado maravilhada com o seu primeiro filme estrangeiro e se apaixonou pelo ator Brenno Mello. Quando conheceu Barack Hussein Obama, pai do ex-presidente, ela o teria achado parecido com Mello. Ficaram casados por 23 anos. Referências BERTONI, Estêvão. Orfeu foi negro e jogador de futebol. Folha de S. Paulo, São Paulo, 15 jul. 2008. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1507200816.htm. Acesso em: 23 de maio. 2023. BRENO Mello. In: WIKIPEDIA: the free encyclopedia. [S. l.], 20 nov. 2022. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Breno_Mello. Acesso em: 23 de maio. 2023. BRENO Mello. In: 3º Tempo Uol. [S. l.], 5 nov. 2018. Disponível em: https://terceirotempo.uol.com.br/que-fim-levou/breno-mello-2458. Acesso em: 23 de maio. 2023. OBAMA é "quase" brasileiro. In: Correio Braziliense. [S. l.], 5 jun. 2010. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-e-arte/2010/06/05/interna_diversao_arte,196187/obama-e-quase-brasileiro.shtml. Acesso em: 23 de maio. 2023.

  • Aurélio Viríssimo de Bittencourt

    Aurélio Viríssimo de Bittencourt nasceu em 1º de outubro de 1849, em Jaguarão, filho da parda Maria Julia da Silva, uma escravizada liberta, e do piloto da Marinha Hypólito Simas de Bittencourt. Venho morar em Porto Alegre logo após a mãe falecer, com sua tia paterna Leocádia. Casou se com Joana Joaquina do Nascimento (1838 - 1895) no dia 26 de dezembro e teve dois filhos, Sérgio Aurélio de Bittencourt, que nasceu no dia 07 de outubro de 1869 e faleceu no dia 05 de novembro de 1904, e Aurélio Viríssimo de Bittencourt Júnior, nascido em 28 de fevereiro de 1874 e falecido no dia 30 de julho de 1910, aos 36 anos. Resgatando o momento em que surge o periódico O Exemplo, ele preenchia o cargo de Secretário da Presidência do Estado, sempre lembrado por contribuir com a criação e, também, manutenção do periódico para estabilidade financeira. Bittencourt iniciou a vida na capital como aprendiz de tipógrafo. Nesta fase, percorreu diversos espaços associativos de Porto Alegre e era considerado um menino instruído. Também trabalhou como escrivão e prior do Divino Espírito Santo e das Irmandades do Rosário. Ainda na juventude, dedicou-se ao serviço público, onde se tornou uma referência importante na administração do Estado. Foi Secretário da Presidência do Estado, nomeado em 17 de junho de 1892, e trabalhou com Júlio Prates de Castilhos no Palácio do Governo do Rio Grande do Sul. Como Bittencourt integrava a direção do Centro Abolicionista, provavelmente já conhecia Júlio de Castilhos, antes mesmo dessa função como seu secretário. Integrou também a direção do Centro Abolicionista o que, provavelmente, ajudou em sua história, contribuindo para sua escolha para o governo por Júlio de Castilhos. Bittencourt e Júlio de Castilho participaram ativamente do processo abolicionista no Rio Grande do Sul. Bittencourt tinha trânsito intenso entre a elite intelectual e política de Porto Alegre e, também, nos espaços negros. Tanto que era considerado pelos membros do jornal O Exemplo como um grande mestre. Em 13 de maio de 1904, o periódico o destaca como o segundo maior atleta na luta pela conquista “de nossos direitos civis e políticos” (dos negros em Porto Alegre). Aurélio nunca deixou de circular no meio da comunidade negra, sempre mantendo-se seguro e influente com a população negra, tanto no campo religioso quanto político da cidade de Porto Alegre. Bittencourt mantinha uma boa relação com vários setores da sociedade e ativa sociabilidade. Com seu prestígio e experiência, foi muito influente na redação do jornal O Exemplo, que passou a ser um veículo direcionado para a defesa das convicções republicanas, principalmente a partir do século XX. Destacou-se no combate ao preconceito existente na capital. Declarva-se pardo e seus escritos demonstram que percebia as diferenças entre os dois mundos em que vivia, entre o povo e a elite, mas nunca abdicou de se destacar como homem negro, intelectual e abolicionista, mesmo dizendo-se das dificuldades em ressaltar essas características. Em sua morte, Aurélio foi homenageado com palavras de saudações que previam a falta que faria ao serviço público e privado. Referências BITTENCOURT, Dario De. Curriculum Vitae–Documentário (1901/1957). Porto Alegre: Ética Impressora Ltda, 1958. SANTOS, José Antônio dos. . Estratégias étnicas e trajetórias de intelectuais negros.. In: VI Encontro Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional, 2013, Florianópolis - SC. Encontro Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional. Florianópolis: UFSC, 2013. v. 01. p. 68-68. Al-Alam, C. C., Pinto, N. G., & Moreira, P. R. S. (2016). Simão Vergara e Maria Tereza da Cunha, o casal de pretos forros da tasca da Boa Vista: Africanidade, matrimônio e comunidade numa sociedade escravista (Pelotas, RS, século XIX). Revista Brasileira De História &Amp; Ciências Sociais, 8(15), 125–153. MOREIRA, Paulo Roberto Staudt. O Aurélio Era Preto: Trabalho, Associativismo E Capital Relacional Na Trajetória De Um Homem Pardo No Brasil Imperial E Republicano. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 40, n. 1, 2014. PERUSSATTO, Melina. Arautos da liberdade: educação, trabalho e cidadania no pós abolição a partir do jornal O Exemplo de Porto Alegre (1892-1911). 2018. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.

  • Adelina Lydia Bittencourt

    Nasceu em 06 de dezembro de 1870, em Porto Alegre. Filha caçula do primeiro matrimônio de Aurélio Viríssimo de Bittencourt e Joanna Joaquina de Bittencourt, tendo como irmãos Aurélio Júnior, que atuou como juiz em Porto Alegre, e Sérgio de Bittencourt, um dos fundadores do jornal O Exemplo. A formação para normalista (professora) de Adelina Lydia inicia-se no ano de 1886. O jornal A Federação faz referência a Adelina como estudante, provavelmente, uma das únicas estudantes negras da Escola Normal. Neste curso para a preparação de professoras, foi aprovada com distinção nas disciplinas de música e canto. Sua formatura ocorreu no ano de 1888 com uma premiação por destaque em várias disciplinas. Com 27 anos, em 29 de maio de 1897, se casa na Igreja Nossa Senhora da Madre de Deus com Júlio Jose Machado, funcionário municipal. Em janeiro de 1900, Adelina já atuava na Escola Complementar em turmas somente para meninas. No ano de 1902, nasce Celina sua primeira filha. Posteriormente, em 1906, surge novamente nas páginas do jornal A Federação, como uma das regentes da Escola Complementar onde lecionou sete anos. Já em 1910, ministrava aulas para turmas mistas, de meninos e meninas. Nos anos seguintes, surge nas colunas sociais do referido jornal, sempre na data de seu aniversário. Em dezembro de 1925, faleceu durante seu discurso no Colégio 13 de Maio. Após a sua morte, em janeiro de 1926, no obituário de O Exemplo, jornal da imprensa negra, é destacada a trajetória de Adelyna, mulher negra e professora nas primeiras décadas do século XX. [...] De gênio afável e comunicativo, o trespasse dessa professora repercutiu consternadora mente no círculo de suas relações, tanto mais quanto bem triste foi o seu falecimento: escolhida pelas suas alunas para paraninfar a turma daquelas que, no ano findo, concluíram o curso elementar no Colégio 13 de Maio, cerimônia efetuada na manhã daquele dia, a professora Adelina proferiu, então, eloquente discurso, repleto de conselhos e ensinamentos e, após concluir a leitura do mesmo, passados poucos minutos, sentindo-se repentinamente mal, tombou ao solo, já morta, pouco depois das 9 horas da manhã. Na manhã de 21, em meio de enorme assistência, tiveram lugar as cerimônias fúnebres de encomendação e sepultamento, na carneira nº 279 do cemitério de S. Miguel e Almas. Avultadíssimo número de coroas e buquês cobriam o ataúde, vendo-se sobre o mesmo o estandarte do Colégio 13 de Maio envolto em crepe. Antes da inumação, falou, no cemitério, a diretora daquela casa de ensino, professora Luiza Wiedmann Borges Fortes e que proferiu sentida oração, apresentando despedidas a leal companheira que tombara no desempenho e no cumprimento de seu dever (O EXEMPLO, 1926). Bibliografia: MATTOS, Jane Rocha. Texto apresentado IHGRS. Jornal O Exemplo. Janeiro de 1926. Jornal A Federação.

  • Adão Alves de Oliveira

    Conhecido como Lelé, alcunha que tem sua origem nos campos de futebol, integrou alguns times como o do Força e Luz. Recebeu o título de majestade do carnaval do antigo território do Areal da Baronesa, onde nasceu em 1925 e morou parte de sua vida adulta. O Areal da Baronesa foi um dos espaços de vivência do carnaval popular e negro da cidade de Porto Alegre nas primeiras cinco décadas do século XX. Cordões, blocos e grupos circulavam nas ruas das famosas avenidas. O título de primeiro Rei Momo Negro do Areal da Baronesa concedido a Lelé partiu da proposição de Arlindo Rosa. Seu reinado perdurou entre os anos de 1948 e 1952. Nas décadas posteriores, desfilava nos carros alegóricos de escolas de samba como um rei africano se vinculando a uma origem africana e aos seus antepassados. Neste sentido, a Etiópia era evocada por Lelé (entrevista em 1991) na abertura dos festejos de momo com a frase “Povo, povo do meu reinado, é com grande satisfação, [...] nem energia para vir lá da minha Etiópia para abrir o Carnaval aqui no Brasil”. Lelé foi Remelexo e esteve à frente dos cordões carnavalescos Ideal e Filhos da Pátria. Além de jogador, trabalhou também como porteiro de teatro atuando em algumas peças. Trabalhou no Banco Nacional do Comércio juntamente com Vicente Rao e na Livraria do Globo. Faleceu no ano de 2013. Bibliografia: Entrevista com Adão Alves de Oliveira (Lelé). Pesquisa “Carnavais de Porto Alegre”. Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Museu Joaquim José Felizardo. Ano 1991. Santos, Irene (org.). Negro em Preto e Branco: História Fotográfica da População Negra de Porto Alegre. 2005.

  • Rua dos Pretos Forros

    A Rua dos Pretos Forros pode ser considerada uma das primeiras ruas do Areal da Baronesa. Limite sul deste antigo território negro, essa via compreendia parte da atual Av. Ipiranga, mais precisamente o trecho entre a Av. Praia de Belas (limite oeste da cidade à época) e a Rua 13 de Maio (atual Av. Getúlio Vargas). Já na década de 1870, quando a região do Areal ainda era uma zona de chácaras, tem-se registros de moradores negros na Rua dos Pretos Forros, embora seu traçado apareça pela primeira vez em um mapa apenas em 1881. Em documentação levantada pela pesquisadora Jane Mattos (2000, p. 47), Rafael, homem pardo, de ofício carpinteiro, cita no ano de 1874, a Rua dos Pretos Forros como seu local de moradia, demarcando a existência da via já nessa época. Imortalizada em poema de Athos Damasceno (1944), a Rua dos Pretos Forros aparece relacionada à liberdade e a manifestações religiosas e culturais negras, como o batuque e o quicumbe e seus instrumentos: xequerês e agogôs. O fato de o termo “forro” designar aqueles que haviam conquistado a alforria (liberdade) dá indícios de seus moradores: pessoas negras libertas (ROSA, 2019, p. 92). No Mapa de 1888, a via já aparece nomeada como Rua 28 de Setembro, data da Lei do Ventre Livre. Instituída em 1871, a lei passou a declarar livre todo filho de mulher escravizada nascida a partir daquela data. Esse é um dos raros casos em que a mudança de nomenclatura não apaga o marcador negro; pois altera o nome, mas mantém o sentido de liberdade. Nesse mesmo mapa documento, a Rua 28 de Setembro aparece repleta de construções, sendo a única via, das poucas da área, amplamente ocupada. Em 1892, a Estatística Predial registra a existência de 46 casas térreas, dois sobrados e assobradados (FRANCO, 2006, p. 425), confirmando a elevada densidade populacional apontada pelo Mapa de 1888. Em 1888, simbolicamente ano da abolição da escravidão, o Areal da Baronesa, ainda sem ruas abertas, tem como seus limites nomenclaturas referentes a dois marcos da emancipação negra: ao sul, Rua 28 de Setembro e à leste, Rua 13 de Maio (data da abolição da escravidão). Por seu significado histórico, essas são consideradas toponímias (nome do lugar) da emancipação negra (VIEIRA, 2020). Nas décadas de 1930/1940 essas vias foram renomeadas para Av. Ipiranga e Av. Getúlio Vargas, perdendo seu sentido relacionado à população negra. A data de 28 de setembro tornou-se amplamente comemorada pela população negra da cidade devido à tamanha importância da Lei do Ventre Livre para esse grupo. Entre o final do século XIX e o início do século XX, a Sociedade Beneficente Cultural Floresta Aurora promove grandes festejos para celebrar a “gloriosa data”. Nessa virada de século, o 28 de setembro é destaque também nas páginas do jornal O Exemplo, periódico negro que tece saudações a esse marco histórico, assim como críticas. Referências FERREIRA, Athos Damasceno. Poemas da minha cidade. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1944. FRANCO, Sérgio da Costa. Porto Alegre: guia histórico. 4. ed. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2006. MATTOS, Jane Rocha de. Que arraial que nada, aquilo lá é um areal: o Areal da Baronesa: imaginário e história (1879-1921). 2000. 158 f. Dissertação (Mestrado em História do Brasil) – Programa de Pós-graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2000. ROSA, Marcus Vinicius de Freitas. Além da invisibilidade: história social do racismo em Porto Alegre durante o pós-abolição. Porto Alegre: EST Edições, 2019. VIEIRA, Daniele Machado. Territórios Negros em Porto Alegre: toponímia da emancipação negra no Mapa de 1888. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), [S. l.], v. 12, n. 34, p. 182-208, nov. 2020. ISSN 2177-2770. Disponível em: https://abpnrevista.org.br/index.php/site/article/view/1136. Acesso em: 14 dez. 2022. VIEIRA, Daniele Machado. Territórios Negros em Porto Alegre/RS (1800-1970): geografia histórica da presença negra no espaço urbano. Belo Horizonte: ANPUR, 2021. Disponível em: https://anpur.org.br/territorios-negros-em-porto-alegre-rs-1800-1970. Acesso em: 14 dez. 2022.

  • Campos da Redenção

    Figura 1: Mapa das Territorialidades Negras em Porto Alegre/RS - Meados séc. XIX = Elaboração Daniele Machado Vieira. Fonte: Cartografia Virtual Histórica Urbana de Porto Alegre Figura 2: Campos da Redenção – década de 1900 Fonte: Iova (atribuído). Acervo Fototeca Sioma Breitman – Museu Joaquim José Felizardo Durante quase todo os 1800, os Campos da Redenção eram uma antiga e grande várzea, uma grande área descampada, baixa e alagadiça, potreiro e caminho de passagem para Viamão. Localizada fora da cidade, mas contígua a ela, foi local de batuques durante todo o século XIX. Coruja, o primeiro cronista da cidade, relata a existência do Candombe da Mãe Rita na década de 1830. “O Candombe da Mãe Rita era na Várzea […] mais ou menos no terreno então baldio e depois ocupado pelas casas do Firmo e Olaria do Juca...” (CORUJA, 1983, p. 26-27). Tal localização refere-se a atual rua Avaí e adjacências, em frente ao prédio da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). De acordo com o autor, “aí se reuniam nos domingos à tarde pretos de diversas nações, que com seus tambores, canzás, urucungus e marimbas, cantavam e dançavam...” (CORUJA, 1983, p. 26-27). É possível que o local tenha durado como lugar de batuques por bastante tempo, pois Achylles Porto Alegre, outro importante cronista da cidade, ao referir-se ao logradouro, relata que “tais terrenos, antes do arruamento e quando de todo abertos, serviam para a realização de festejos negros africanos, que ali realizavam seus ruidosos candomblés” (1994, p. 16). Na década de 1850, Maria José, mulher negra, liberta, apresentando-se como rainha ginga da Irmandade do Rosário, solicita às autoridades policiais licença para os negros realizarem seus festejos na área central (DIAS, 2008, p. 30). Após reiteradas solicitações, Maria José finalmente obtém autorização, a qual indica a Várzea como lugar para os batuques, “por ser fora do Centro da cidade” (DIAS, 2008, p. 33). No final do século ainda vão existir batuques na área, como os realizados em frente à Capelinha do Bom Fim. Achylles refere-se a esse batuque “ao ar livre” como “um dos mais populares,” acrescentando que “muita gente se abalava da cidade [o Centro] para ir ver a dança dos negros” (1994, p. 101). Note-se que esse batuque localizava-se ao lado da atual av. Osvaldo Aranha, na face oposta ao Candombe da Mãe Rita (localizado para nas imediações da atual av. João Pessoa), evidenciando a existência de festejos negros em diferentes pontos da antiga Várzea, assim como sua continuidade ao longo de todo o século dezoito. Em 1884, a Várzea ganha o nome oficial de Campos da Redenção, como forma de comemorar a libertação dos escravizados da cidade. Realizada em “Sessão Extraordinária comemorativa da redempção dos escravos do município de Porto Alegre,” ocorrida em 7 de setembro de 1884, na Câmara Municipal, a alteração teve o seguinte texto: O sr presidente declarando que convocara a Câmara para comemorar a libertação dos escravos na cidade de Porto Alegre e seu município, propõe, para solenizar de uma maneira perdurável o fato grandioso e patriótico, que o Campo do Bom Fim passe a denominar-se “Campo da Redempção”. É unanimemente aprovada esta proposta (CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, 1884, p. 2). Embora tenha sua contribuição para a libertação, essa não foi uma grande abolição, visto que já havia um significativo contingente de libertos e que ainda restaram escravizados após 1884, conforme evidenciam, por exemplo, as pesquisas de Paulo Moreira (2003, p. 173, 180). É importante considerar que os negros: a) pagaram por cerca de 40% das suas cartas de alforrias (MOREIRA, 2003, p. 258), libertando a si e sua família; e b) que a área da Várzea já era um local de batuques, de congregação religiosa e social do grupo negro ao longo de décadas, sendo justo que fosse marcada por essa presença com sua nova denominação de Campos da Redenção, a qual permanece até hoje, quase um século e meio após. Referências CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE. Ata da Sessão Extraordinária comemorativa da redempção dos escravos do município de Porto Alegre, realizada no dia 07/09/1884. Livro de Ouro, Porto Alegre, p. 2-3, 1884. CORUJA, Antônio Alvares Pereira. Antigualhas: reminiscências de Porto Alegre. Porto Alegre: Cia União de Seguros Gerais, 1983 [1881]. DIAS, Glauco Marcelo Aguilar. Batuques de negros forros em Porto Alegre: um estudo sobre as práticas religiosas de origem africana na década de 1850. 2008. 69 f. Trabalho de Conclusão (Graduação em História) – Departamento de História, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008. MOREIRA, Paulo Roberto Staudt. Os cativos e os homens de bem: experiências negras no espaço urbano, Porto Alegre 1858-1888. Porto Alegre: EST Edições, 2003. PORTO ALEGRE, Achylles. História popular de Porto Alegre. Porto Alegre: PMPA: Unidade Editorial, 1994. VIEIRA, Daniele Machado. Territórios Negros em Porto Alegre: toponímia da emancipação negra no Mapa de 1888. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), [S. l.], v. 12, n. 34, p. 182-208, nov. 2020. ISSN 2177-2770. Disponível em: https://abpnrevista.org.br/index.php/site/article/view/1136. Acesso em: 14 dez. 2022. VIEIRA, Daniele Machado. Territórios Negros em Porto Alegre/RS (1800-1970): geografia histórica da presença negra no espaço urbano. Belo Horizonte: ANPUR, 2021. Disponível em: https://anpur.org.br/territorios-negros-em-porto-alegre-rs-1800-1970. Acesso em: 14 dez. 2022.

Realização:

Design sem nome (8).png

Apoio:

Design sem nome (7).png
rBYewJWAM8ZbQVghG1jzhCIlmw6wIp7lzQeRCyjh.jpeg
Design sem nome (29).png
Elefante Preto.png

Podcast:

Design sem nome (37).png

Financiamento:

bottom of page