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  • Cais do Porto de Porto Alegre – “Cais Mauá”

    A construção de um cais para a cidade era o desejo dos vereadores já em 1833 quando enviaram para a Câmara Municipal uma proposição de construção do cais e de rampas às expensas dos proprietários confinantes. Foi aprovada, mas nunca executada. Em 1912, iniciou-se a obra do Cais do Porto, a partir de um grande aterro. O primeiro trecho do cais, junto ao portão geral, ficou pronto em 1913. Contudo, as obras só foram retomadas em 1919. Dois anos depois, em 1921, foram entregues mais 490 m de cais. Quase no final do governo do presidente Borges de Medeiros, estavam concluídos 1.652,88 m de cais acostável, dotado de 10 armazéns e 22 guindastes elétricos. Entre 1935 e 1936, foi construído o Frigorífico do porto, além de mais centenas de metros do cais fluvial. O pórtico central e os dois armazéns que o ladeiam foram construídos entre novembro de 1919 e maio de 1922. Possuem estruturas metálicas classificadas à época de “ossatura de ferro”, encomendadas à Casa Daydée, de Paris, em 1919, com o gradil de fabricação nacional, de Emílio Hugo e Cia. Um engenheiro francês, Henry Hausser, veio a Porto Alegre para orientar o trabalho de construção, que foi finalizado sob responsabilidade dos engenheiros Trajano Ribeiro e João Fernandes Moreira. Hoje, o Cais Mauá não tem mais a função portuária, conta com uma área de 181.292,21 m2 e ocupa linearmente uma faixa de aproximadamente 3,3 km ao longo do Rio Guaíba. Estão tombados pela União (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional [Iphan]) o pórtico e os armazéns laterais (A e B), constando como patrimônio cultural nacional desde 1983. O município, por sua vez, tombou a série de Armazéns A1 a A6 e B1 a B3 em 1996. Integram os bens protegidos os edifícios sede do Departamento Estadual de Portos Rios e Canais (Deprec) e do antigo frigorífico, as gruas para movimentação de carga, que correm em trilhos metálicos na base da estrutura do telhado, os enormes guindastes ao longo do cais e o pavimento de granito. Não se encontrou informações na bibliografia consultada sobre a presença do negro escravizado ou alforriado na construção do porto mas, através de pesquisas, sabe-se que o conjunto de trabalhadores responsáveis pela carga e descarga de mercadorias no porto era constituído, fundamentalmente, de homens pobres ditos livres e/ou recém-libertos. Muitos deles mantinham fortes vínculos com descendentes africanos escravizados ou já haviam sido escravizados, prestando serviços na orla portuária, mediante aluguel a um senhor, para os serviços de capatazia e estiva, conforme a movimentação portuária. Na organização dos estivadores, como uma classe, a presença do negro foi muito importante. Em 1919, foi fundada a União dos Estivadores de Porto Alegre, na sede do Sindicato dos Foguistas, também em Porto Alegre, onde estavam presentes as principais lideranças dos estivadores, na sua maioria ligada ao segmento afrodescente da população. Na frente do portão do Cais havia um largo que se constituía em espaço público de ingresso à Av. Sepúlveda, no qual se aglomeravam os estivadores, esperando a chamada para entrar no porto, conforme os navios iam aportando e precisando de trabalhadores para a descarga. Eles ficavam ali, chegando a reunir até cerca de 600 trabalhadores, ao relento, em época de muito movimento portuário. Diante disso, os portuários pediram aquela área ao presidente Getúlio Vargas, que a concedeu informalmente e não se tem certeza da existência de um documento de doação. Os estivadores, com meios próprios originários de contribuição voluntária, foram construindo uma edificação para sua sede, chegando a abrigar uma cantina. Quando a construção do prédio estava no primeiro pavimento, a ditadura civil-militar tomou a construção e expulsou de lá os estivadores. Os funcionários do Deprec, consternados, permitiram que eles usassem um refeitório desativado para se abrigar (Ana Lúcia Goelzer Meira, informação verbal)*. Hoje, no local onde antigamente existia o largo em homenagem a João Cândido, localiza-se a Delegacia Regional do Trabalho, edifício construído em 1978, com o intuito de apagar a memória do Almirante Negro. Consta que este imóvel não possui registro aprovado e/ou vistoriado na Administração Municipal, nunca teve alvará de funcionamento, tendo sido interditado, em 2015, pelas péssimas condições estruturais e de conservação, sendo pedida a sua demolição pela Polícia Militar de Porto Alegre (Ana Lúcia Goelzer Meira, informação verbal)*. Em 2002, um dos armazéns do cais, possivelmente o A1, foi destinado ao Espaço Cultural João Cândido, que reuniria vários segmentos como dança, cinema, artesanato, entre outros. Para o lançamento do espaço, houve a inauguração de uma placa em homenagem ao Almirante Negro, destacando “sua luta contra a discriminação e a favor da igualdade brasileira”. Infelizmente, com a troca do Governo do Estado, o projeto não prosseguiu e a placa desapareceu (Antônio Matos, informação verbal)**. *Entrevista com Ana Lucia Goelzer Meira, em agosto de 2022, sobre a possível existência o Largo Almirante Negro e documentação sobre tais prospecções que estavam sendo feitas conjuntamente com a arquiteta Briane Bicca, 2019. **Entrevista com Antônio Matos, em agosto de 2022, sobre a identificação e designação de um dos armazéns do cais, em homenagem a João Cândido. Referências BRASIL. Processo n.º 1.047-T-81, Divisão de Registro e Documentação: pórtico central e armazéns do cais do porto. Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional: Porto Alegre, RS, 1981. VIVIAN, Diego Luiz. Indústria portuária Sul-Rio-Grandense: portos, transgressões e a transformação da categoria dos vigias de embarcações em Porto Alegre e Rio Grande (1965 – 1964). 2008. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008. MATTOS, Jane Rocha de. Foguistas e estivadores: organizações operárias negras no início do século XX no mundo do cais (Porto Alegre). Comunicação apresentada na VIII Jornada Estadual de Estudos Afro-Brasileiros: “O negro sul-rio-grandense nos diferentes contextos locais”. Porto Alegre, 2020. Entrevista com Antônio Matos, em agosto de 2022, sobre a identificação e designação de um dos armazéns do cais, em homenagem a João Cândido.

  • Pegada Africana – Museu de Percurso do Negro

    A “Pegada” é de autoria de Vinícius Vieira e foi inaugurada em 14 de novembro (dia da traição de Porongos) de 2011. Possui o formato de um pé composto por pedras negras e delineado por uma moldura de aço que mede 300 x 200 cm. A escultura faz alusão, ou melhor, é um mapa do continente Africano, onde os dedos representam os países insulares, Ilhas de Cabo Verde, Ilhas de Comores, República de Maurício, Ilhas de São Tomé e Príncipe e Ilhas Seicheles. Abaixo e ao lado do continente está a Ilha de Madagascar. Localizado no piso da Praça da Alfândega e posicionado muito próximo ao calçadão em forma de ondas da Rua da Praia (Andradas) o monumento remete simbolicamente à presença ancestral negra naquele espaço e ao deslocamento contínuo desta população desde ao menos o século XVIII configurando o espaço urbano a partir de uma leitura especial da cidade do ponto de vista de sua cultura e de estratégias de sobrevivência. A Pegada Africana representa o conceito motriz do museu, ou seja, a ideia de percurso, de caminhada, ao mesmo tempo em que torna perene a presença negra em Porto Alegre. É a partir do pé negro naquele chão – Praça da Alfândega: antigo Largo da Quitanda e o mais importante cais da cidade – que se pode transmutar para os séculos XVIII e XIX onde negros escravizados chamados de escravos de ganho, que misturados a libertos, a fugitivos e quilombolas transitavam pelas ruas da capital, exercendo uma sociabilidade de encontros, informações e cultura. Aos locais marcados por esta presença no passado, a “Pegada” direciona a caminhada a outras representações contemporâneas do espaço urbano, como é o caso da Esquina Democrática, ou melhor, Esquina do Zaire, e o Largo Zumbi dos Palmares, entre outros. A escultura, fruto da juntada de pedras pretas quando a Praça da Alfândega estava sendo restaurada por operários de maioria afro-brasileiros, é a marca da presença negra em percursos atuais, como o roteiro de artistas que era liderado pelo poeta Oliveira Silveira e outros, realizados por grupos de religiosos. A Pegada, simbolizada na prática de realizar percursos a pé, é uma das expressões e constituição da identidade negra em Porto Alegre. Os laços com a África ancestral não estão somente na forma do monumento, mas no conjunto de árvores e flores da Praça. Explica-se: A “Pegada” foi executada para interagir com a coloração natural na primavera (quando foi inaugurada), ou seja, o verde (árvores), o amarelo (flores dos ipês) as pedras vermelhas e as pretas configuram as cores e a bandeira do pan-africanismo. . Referências: VARGAS, Pedro R. O Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre ou, para muitos, a surpreendente história de um museu que não parece museu dedicado a um gaúcho que não é percebido como gaúcho. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015 SOUZA, Vinicius Vieira. Artes Visuais de Referência Afro-brasileira no espaço público de Porto Alegre. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015 MARAFIGA, Valéria Z. Arte como lugar de memória: uma reflexão sobre o Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre. UFRGS, Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. Porto Alegre, 2021

  • Tambor – Museu de Percurso do Negro

    O Tambor amarelo – por referência a Oxum – gravado de figuras longilíneas que contam a trajetória do negro em Porto Alegre, já é uma das marcas da Praça Brigadeiro Sampaio, também conhecida por Praça da Harmonia e cada vez mais reconhecida pela população como Praça do Tambor. É um passo significativo para percorrer o Museu de Percurso do Negro. Esta escultura foi erguida em 2010 como obra-síntese da proposta do museu: concebida por um coletivo de artistas e memorialistas (griôs), orientada por uma pesquisa antropológica elaborada por Iosvaldyr Bittencourt e, a partir deste processo, conduzida por meio de uma oficina de formação de monitores de um projeto direcionado a jovens militantes e outros em situação de vulnerabilidade social indicados pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc). O formato de discussões e elaboração do trabalho foi pensado para ser realizado dentro de valores civilizatórios de matriz africana, como ouvir a voz dos griôs, se reunir em círculos e avançar na proposta de arte coletiva. Artistas, griôs e orientadores dos estudos antropológicos tiveram o desafio de elaborar uma proposta estética para um marco simbólico que sintetizasse a cultura negra brasileira forjada na matriz africana. Ainda precisava ser uma obra que “desapagasse” a presença negra naquela parte do território da cidade, conhecido no século XIX por Largo da Forca. A esse respeito relata o artista visual Leandro Machado “teríamos que ter uma coisa muito forte e significativa. Então, julgamos que o tambor sintetizava e, ao mesmo tempo, englobava todas as diversidades que são expressas pela cultura negra”. O Tambor, em poucos anos, se tornou um dos símbolos mais potentes da representatividade do negro na formação da cidade e, ao mesmo tempo, instrumento de denúncia sobre a pouca, ou nenhuma representatividade da cultura de matriz africana no escopo de monumentos da capital. Cabe, ainda, salientar que o tambor toca na identidade e na saudade dos imigrantes chegados ao RS no século XXI – os africanos e os latino-americanos. Coletivo de artistas: George Pinto, André Venzon (se desligaram do projeto), Adriana Xaplin, Leandro Machado, Marcos Mattos, Pelópidas Thebano, Elaine Rodrigues (do Mocambo) e Carlos Augusto da Silva, o Gutê. Griôs: José Calixto Ferreira, mestre Borel; Nilo Feijó; Elaine Rodrigues e José Alves Bitencourt o Lua. Referências: VARGAS, Pedro R. O Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre ou, para muitos, a surpreendente história de um museu que não parece museu dedicado a um gaúcho que não é percebido como gaúcho. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015 SOUZA, Vinicius Vieira. Artes Visuais de Referência Afro-brasileira no espaço público de Porto Alegre. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015

  • Bará do Mercado-Museu de Percurso

    O terceiro marco visual do Museu de Percurso do Negro, chamado “Bará do Mercado”, foi inaugurado em 7 de fevereiro de 2013, mesmo dia em que o lugar do assentamento do Bará foi indicado e aprovado pelo Conselho do Patrimônio Histórico e Cultural (COMPAHC) como Bem Cultural de Natureza Imaterial de Porto Alegre, passando a fazer parte do patrimônio cultural da cidade. A solicitação para o registro junto à Secretaria de Cultura da capital foi iniciativa da Congregação em Defesa das Religiões Afro-brasileiras (CEDRAB). A obra é formada por sete chaves de bronze, colocadas em sentido anti-horário, envoltas por dois círculos excêntricos, um amarelo e outro vermelho, formados por pedras de granito. As chaves estão conectadas a correntes também de bronze, que juntas apontam para sete diferentes coordenadas geográficas, sendo duas delas direcionadas ao Lago Guaíba. Os ferrolhos das chaves mostram duas formas diferentes, uma destinada ao Bará Agelú e outra ao Bará Lodê. O mosaico está situado sobre o assentamento dedicado ao Bará, no centro do Mercado, uma grande encruzilhada marcada pelo encontro das quatro linhas que demarcam as entradas da edificação. O monumento, idealizado por Mãe Norinha de Oxalá, que é fruto do labor coletivo e de uma soma de saberes, foi concebido por Pelópidas Thebano e Leandro Machado, e executado por Vinicius Vieira, Leandro Posenato e Vilmar Santos. A homenagem em pedra ao Orixá Bará é a solidificação de um processo de aproximação entre o campo religioso e o ativismo do movimento negro. Em outras palavras, marca o reconhecimento da dimensão étnica do embate religioso contra a intolerância religiosa. As demandas do CEDRAB por valorização do patrimônio histórico e cultural africano por meio de evidenciar a “Tradição Bará do Mercado” encontrou apoio decisivo das organizações do movimento negro, coroando esta obra de arte como um ponto emblemático do Museu de Percurso do Negro. Referências: SOUZA, Vinicius Vieira. Artes Visuais de Referência Afro-brasileira no espaço público de Porto Alegre. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015 VARGAS, Pedro R. O Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre ou, para muitos, a surpreendente história de um museu que não parece museu dedicado a um gaúcho que não é percebido como gaúcho. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015

  • Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre

    O Museu de Percurso do Negro é um museu de território. Propõe a ativação da memória da presença negra por meio de elementos materiais (monumentos) distribuídos ao curso de lugares na capital gaúcha que são referência para a memória negra e que foram ao longo do tempo apagadas do contexto de formação étnica de Porto Alegre. Embora a primeira escultura do Museu – Tambor – tenha sido realizada em 2010 com recursos econômicos e apoio do Projeto Monumenta do governo federal e da Prefeitura de Porto Alegre, a criação deste Museu sempre esteve nas mãos e nos desejos das associações e dos militantes do movimento negro. Naquela ocasião, foi criado um conselho gestor do projeto com entidades do Movimento com autonomia para definir os rumos da ação, perfil dos artistas e aplicação do investimento monetário. No entanto, os primeiros esforços para colocar em prática as ações que iriam ser materializadas no museu aconteceram no final da década de 1990, quando diversas organizações do movimento negro se reuniram para discutir e pautar o I Seminário para organização de um Centro de Referência Afro-brasileiro (CRAB), que teria por objetivo catalisar programas e projetos que desenvolvessem políticas em prol da comunidade negra. Este seminário, em 1996 e mais dois nos anos de 1997 e 1998, levantaram, entre outras questões importantes, dois problemas interrelacionados: o processo de apagamento paulatino da memória negra, em especial, no que tange a identificação de espaços e lugares da cidade com a população negra e, como contramovimento, a necessidade que se impunha de marcar pontos importantes no território da capital para uma escrita espacial da história do negro. Visando mediar o conflito entre memória e esquecimento se propôs erguer monumentos que sinalizassem a relação dos espaços escolhidos com a cultura e a presença negra, ou seja, procurava-se a marcação de um território negro, invisível, não apenas no espaço, mas também no tempo. Além do Tambor na Praça Brigadeiro Sampaio – já chamada de Praça do Tambor, se conta com A Pegada Africana, na Praça da Alfândega, o Monumento ao Bará, no Mercado Público, e o Painel Afro-brasileiro, no Largo Glênio Peres, porém, se está falando de um museu em movimento e em constante construção. O museu superou seus ideais e limites de instrumento de ativação da memória negra no território da cidade, se convertendo, como assinala a pesquisadora Elza da Rosa, como divisor de águas pela capacidade que construiu de alavancar a luta por mais direitos, políticas públicas e inclusivas e garantias de dignidade humana (ver Quadro a seguir). ATIVIDADES REALIZAÇÃO Primeiras articulações para a criação do CRAB - Década 1990 Reuniões preparatórias para o I Seminário de Criação do CRAB - 1996 Seminário de criação do CRAB e oficinas - 1997 Seminários II e III - 1998/99 Plano de Ação do Projeto Monumenta - 2002 Início do Projeto do Museu nas ações do Projeto Monumenta - 2008 Pesquisa Histórico-antropológica e pesquisa Museológica - 2009 Desenvolvimento de 5 projetos para obras de arte pública por artistas do grupo de artistas do Museu - 2009 Tambor – I Etapa/Formação da 1ª turma de jovens monitores - 2010 Lançamento do livro de registro da experiência do Museu - 2010 Pegada Africana – II Etapa - 2011 Bará do Mercado – III Etapa - 2013 Painel Afrobrasileiro – IV Etapa/Formação da 2ª turma de monitores - 2014 Lançamento do Catálogo do Museu - 2015 Referências: VARGAS, Pedro R. O Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre ou, para muitos, a surpreendente história de um museu que não parece museu dedicado a um gaúcho que não é percebido como gaúcho. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015 SOUZA, Vinicius Vieira. Artes Visuais de Referência Afro-brasileira no espaço público de Porto Alegre. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015 VILASBOAS, Ilma Silva; BITTENCOURT JÚNIOR, Iosvaldyr C; SOUZA, Vinicius Vieira. Museu de Percurso do Negro em `Porto Alegre. Editora Porto Alegre, 2010 ROSA, Elza Vieira. O Museu de Percurso do Negro de Porto Alegre-RS: Interrompendo Invisibilidades, Reescrevendo experiências negras na cidade. Dissertação de Mestrado em Sociologia, Porto Alegre : UFRGS, 2019

  • Mercado Público Central de Porto Alegre – “Mercado”

    Construído para ser centro de compras e abastecimento de alimentos da cidade, o Mercado de Porto Alegre foi erguido entre 1867 e 1869 por mão de obra negra escravizada. Inaugurado em 1870, era originalmente um quadrilátero formado por um piso e quatro torreões nas extremidades e a execução da obra exigiu o aterramento de parte do Lago Guaíba. Sua forma atual foi realizada em 1912 com a incorporação de um segundo pavimento, momento em que foram elaborados nas suas fachadas os elementos decorativos que dão à edificação o aspecto neoclássico que ostenta até os dias atuais. Também é importante destacar que, ao longo da sua história, o velho mercado sofreu quatro incêndios: o primeiro em 1912 de grandes proporções, outros dois em 1976 e 1979 e, o último, em 06 de julho de 2013, que consumiu quase a metade do segundo pavimento. O prédio é tombado na condição de monumento histórico desde 1979, e passou por uma restauração entre 1992 e 1997 que trouxe ao edifício a cobertura que possui hoje em dia e a retirada de uma banca que ocupava o centro do mercado deixando livre o cruzeiro proporcionado pelo cruzamento dos corredores advindos das quatro portas que caracterizam a edificação. No entanto, para falar das profundas relações estabelecidas entre o Mercado e a comunidade negra será necessário um exercício para deslocar o eixo de análise, que antes repousava na natureza do objeto como elemento determinante do conceito de patrimônio, ou seja, deixar de ver apenas o Mercado, prédio histórico e elemento marcante na arquitetura do Centro, para prestar atenção nas relações que se estabelecem entre o Mercado e os diferentes sujeitos – da comunidade negra – no tempo e no espaço. Nesse sentido, se vai recorrer à relação patrimonial com o Mercado Público que firmam os grupos de sacerdotes de religiões afro-brasileiras e os militantes do movimento negro. A presença cotidiana de Yalorixás e Babalorixás no Mercado está associada à Tradição Bará do Mercado – registrada como patrimônio imaterial de Porto Alegre. Essa tradição é viva porque se retroalimenta da energia advinda da prática (ritual do passeio e ofertas jogando-se moedas ou balas de mel) de reverenciar e buscar o axé do orixá. É vista como um símbolo da resistência ao apagamento da memória negra. A pesquisa de Vargas (2011) destaca o depoimento de um sacerdote: Com certeza ali tem algo mais do que simples espaço comercial. É uma construção (o mercado) de negros, a gente compreende que essa energia (axé) do Bará, que foi enterrado ali pelos escravos ou pelo Príncipe Custódio, é também do próprio negro, é uma história de resistência [...]. Quando o filho sai do terreiro, primeiro contato com o mundo é a relação com o mercado, que é símbolo da resistência do nosso povo, a memória de toda a contribuição dada pelo povo negro para a sociedade gaúcha. A ideia de resistência ao apagamento da memória está relacionada à longevidade da prática religiosa no interior do Mercado. Outro sacerdote complementa: Nasci numa casa de religião, Oió, e desde os sete anos de idade ia ao Mercado fazer obrigação. Nasci em 1935, minha mãe em 1915 e minha avó em mil oitocentos e pouco e todas iam ao Mercado, iam defendendo nossa raça e querendo fazer as coisas para o negro. O Bará do Mercado é nossa tradição de luta, de resistência e que não pode se perder. Ponto que ainda merece destaque é o fato de que até o processo de restauração do Mercado (1992-1997) a prática de reverenciar Bará era pouco conhecida para além dos próprios sacerdotes. A visibilidade desta prática trouxe a necessidade de construir uma narrativa voltada para a sociedade mais ampla sobre as origens do assentamento ao orixá Bará no cruzeiro que marca o centro do Mercado. De maneira sintética, a responsabilidade por assentar o orixá é dada aos trabalhadores escravizados que trabalharam na construção do prédio entre 1867 e 1869 ou ao Príncipe Custódio, personagem complexo que merecerá um verbete próprio. A mão do Príncipe vai conferir um ato nobre à formação das religiões afro-brasileiras em Porto Alegre. A prática ritual e as versões sobre o assentamento de Bará são fontes para se pensar sobre os territórios e os deslocamentos das populações negras no tempo e no espaço. O ritual do Passeio que é a prática de se apresentar os novos sacerdotes ao orixá, com algumas variações, contempla a entrada dos grupos de religiosos pela porta do Largo Glênio Peres, o ritual no centro do Mercado, a saída pela porta da Avenida Júlio de Castilhos, antiga Doca do Peixe e paisagem do Guaíba, como reverência a Oxum, a entrada pela porta da Avenida Borges de Medeiros e a saída pela Praça Parobé, lembrando a peregrinação com destino à Igreja do Rosário dos Pretos. Este trajeto pode ser comparado à grande circulação de negros na área do Mercado no século XIX. Já Custódio, que faleceu em 1935, é apontado por realizar e orientar outros assentamentos em pontos diversos da cidade. O príncipe residia na Cidade Baixa e, segundo relatos de sacerdotes, até os anos 1940, outros religiosos como Antônio de Oxum, Chico de Iemanjá, Paulino de Ogum e Idalino de Ogum assentaram sete Barás em Porto Alegre sendo eles colocados na Cidade Baixa; na Colônia Africana; na Bacia do Montserrat; na Ponta do Guaíba; e na região da Usina do Gasômetro. O outro grupo aqui citado, os militantes do movimento negro, desenvolveu também uma relação especial com o Mercado. Estes destacam o segundo piso, por ter sido local de resistência e oposição ao regime militar (1964-1985), onde ficavam instaladas livrarias e outros equipamentos culturais, sendo ainda lugar de reuniões e nascimento do Movimento Negro Unificado (MNU). Alguns bares e outros pontos são vistos como enclaves negros e continuação da presença negra naquela área do centro, por exemplo, o grupo de estivadores que trabalhava no porto da cidade. O Mercado é entendido como o centro de onde se irradiam todas as manifestações e reivindicações do povo negro. Por ter sido construído por mão de obra compulsória ou escravizada, é percebido como um monumento negro por ser uma obra que espelha a contribuição do negro para a cultura gaúcha. O local é, talvez, o patrimônio edificado mais importante da capital. Concorda-se com o antropólogo Antônio Arantes quando ele diz que espaços edificados exercem significativo caráter reflexivo sobre a ação social, ou seja, ao encaminhar marchas e ações saindo do Mercado, o movimento negro incorpora às suas reivindicações e demandas a história e a importância espaço para a comunidade negra. Referências: VARGAS, Pedro Rubens. A relação patrimonial na restauração de bens culturais: o mercado de Porto Alegre e os caminhos invisíveis do negro. Curitiba: Appris, 2017. LORENTZ, Kátia B.; GIOVANAZ, Marlise. Relatório de Pesquisa Mercado Público Central de Porto Alegre Parte I. Porto Alegre: SMC/PMPA, 2003

  • O Jornal O Exemplo

    O jornal O Exemplo (1892 - 1930), como outros, colaborou para uma memória distinta sobre a negritude brasileira. O periódico teve algumas interrupções e retornos, que marcam suas 3 fases. O periódico destacou-se pela construção de narrativas e múltiplas vivências de mundo do povo negro em um território de lutas éticas marcado por diversos fatos significativos para sua comunidade, valorizando e contribuindo com ela, bem como mostrando as discordância na sociedade vigente no período. No momento que se lê o jornal, as memórias parecem vivas e se encontram justamente nos acontecimentos que demonstram a necessidade de cuidados para a preservação das memórias históricas e culturais dos negros. É possível considerar que O Exemplo, assim como outros periódicos negros, foram recursos que contribuíram na construção de uma memória sobre o negro no Brasil, a partir de uma relação, ou seja, conexão de proximidade, não só em relação ao sistema escravocrata, mas sim de luta e resistência em outros campos. O Exemplo foi fundado após reuniões diárias no Salão Calisto, de Calisto Felizardo de Araújo e filhos. Seu escritório foi usado durante a primeira fase (1892-1897). O Salão Calisto localizava-se na rua dos Andradas, número 247, no centro da cidade de Porto Alegre, feito por e para pessoas negras. O editor Arthur de Andrade descreveu O Exemplo como um jornal “literário, crítico e noticioso”. Entre os membros estavam Arthur Ferreira de Andrade, Marcílio Francisco da Costa Freitas, Arthur Pinto Gama, Alfredo Cândido de Souza, Sérgio Aurélio de Bittencourt, Aurélio Viríssimo de Bittencourt Júnior, Florêncio Calisto Felizardo da Silva e Esperidião Calisto Felizardo da Silva, que completa a lista da primeira fase do periódico. A primeira fase do jornal encerrou-se no dia 21 de janeiro de 1897. Ele voltou a funcionar em 5 de outubro de 1902, retomado pelo fundador Esperidião Calisto e pelos novos membros Tácito Pires e Vital Batista, os dois do movimento operário da capital. Esta fase estendeu-se até 1911, com alguns intervalos. A última fase foi entre 1916 e 1930. O jornal teve uma movimentação feminina, algo que acontecia em poucas associações negras porto-alegrenses. A publicação teve duas colaboradoras bem ativas: Sophia Ferreira Chaves e Carmem D’Aguiar, ampliando o campo de possibilidade de entendimento sobre as relações e inquietações das mulheres nos demais projetos coletivos além do jornal O Exemplo. O periódico nasceu nesse campo, no combate aos preconceitos que atingiam a população negra. Ademais, havia também uma disputada pela narrativa histórica, indo ao encontro a uma das palestras que se tornou um livro da escritora Chimamanda Ngozi Adichie, O perigo da história única (2019), e, também, do já descrito pela historiadora Beatriz Nascimento, que destacou em seu livro Eu sou Atlântica (2006) que a história da raça negra ainda está por fazer, dentro de uma história do Brasil ainda a ser feita. Beatriz propunha, como projeto, uma interpretação histórica do Brasil que colocasse no centro da análise a racialização das relações sociais e históricas. Um dos fundadores de O Exemplo, Marcílio Francisco da Costa Freitas, destaca um trecho no jornal nessa mesma linha das autoras referidas comentando que “não haveria o 15 de novembro se não fosse o 13 de maio.” Isso nada mais é que o protagonismo da população negra sobre a história do Brasil. Na segunda fase, Tácito Pires, um dos membros do jornal O Exemplo, e um dos fundadores, Esperidião Calisto, buscaram criar uma escola noturna. Num dos exemplares do periódico da época vinha um anúncio do “Ateneu Popular”. Ali estavam indicadas as ideias e os motivos que estimularam a criação de escola noturna desse tipo e para quem ela era destinada. Eles nomearam de Escola Noturna O Exemplo, com a intenção de proporcionar um melhor “destino social” às crianças, e levantar intelectual e moralmente a classe. Em 1908 foi a vez da proposta da criação do Asilo Treze de Maio para acolher crianças abandonadas, sobretudo as “de cor preta e parda” que não eram aceitas nas instituições que cuidavam desse serviço. Mas tanto a escola quanto o asilo não tiveram continuidade em razão da escassez de recursos materiais das coletividades envolvidas. Por isso e também pelo posicionamento negligente do Estado diante dessas demandas. A última fase foi a da ideia de voltar esses estabelecimentos de ensino para as crianças vulneráveis, buscando assim cobrar que as instituições teriam que ensiná-las de modo a garantir o seu aprendizado. O jornal era destinado para a população negra. Os membros do grupo que o fundou era de pessoas negras letradas e, diante de todas as discriminação que eles, mesmo letrados, sofriam junto à população negra sul do país, sua luta era por direito à educação, cidadania e contra o preconceito de cor (racismo). Referências ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. SOUSA, Ricardo Costa. Redes de sociabilidades no jornal o exemplo (1892-1905). In: Anais do III Seminário de Educação, Conhecimento e Processos Educativos: educação e formação humana, 2019. Criciúma: Ed. UNESC, 2019. MÜLLER, Liane S. As contas do meu rosário são balas de artilharia: irmandade, jornal e associações negras em Porto Alegre (1889-1920). 1999. Dissertação (Mestrado em História) – PUCRS, Porto Alegre, 1999. PERUSSATTO, Melina. Arautos da liberdade: educação, trabalho e cidadania no pós abolição a partir do jornal O Exemplo de Porto Alegre (1892-1911). 2018. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018. PINTO, Ana Flávia Magalhães. A imprensa negra no Brasil do século XIX. São Paulo: Selo Negro, 2010. RATTS, Alex. Eu sou atlântica. Sobre a trajetória de vida de Beatriz Nascimento. São Paulo: Imprensa Oficial, 2006. ZUBARAN, Maria Angélica. O Acervo do Jornal O Exemplo (1892-1930): patrimônio cultural afro-brasileiro. Revista Memória em Rede, Pelotas, v. 7, n. 12, 2015.

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